Em um revés para o Planalto, o Supremo
Tribunal Federal (STF) decidiu ontem permitir a vacinação obrigatória contra
covid. Por 10 a 1, o tribunal entendeu que Estados e municípios podem decidir
sobre a obrigatoriedade da imunização e até impor restrições para quem se
recusar a ser vacinado. A medida não significa vacinação à força, sem o
consentimento do indivíduo. O presidente Jair Bolsonaro, em discurso na Bahia,
criticou a decisão e atribuiu a exigência a ditaduras.
O julgamento foi concluído em
um momento em que Bolsonaro trava uma disputa política com governadores pelo
protagonismo envolvendo a imunização da população. “O Estado pode, em situações
excepcionais, proteger as pessoas mesmo contra a sua vontade. A vacinação é
importante para a proteção de toda a sociedade, não sendo legítimas escolhas
individuais que afetem gravemente direitos de terceiros. É legítimo impor o
caráter compulsório de vacinas que tenham registro em órgão de vigilância
sanitária e em relação às quais existam consenso médico-científico”, disse o
ministro Luís Roberto Barroso, o segundo a votar no julgamento, iniciado na
quarta.
Barroso ressaltou que a
expressão vacinação obrigatória não significa que alguém poderá ser imunizado à
força. “O que decorre desse caráter compulsório é a possibilidade de a
exigência da vacinação constituir condição para a prática de certos atos (como a
matrícula em escola) ou para a percepção de benefícios (como recebimento de
bolsa família), ou que sejam aplicadas penalidades em caso de descumprimento da
obrigação. Qualquer condição ou sanção, para ser válida, deverá observar os
princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, estando sempre sujeita ao
crivo judicial”, frisou.
Em discurso em Porto Seguro, na
Bahia, Bolsonaro comparou a vacinação ao tratamento contra o câncer. “Se o cara
não quer ser tratado, que não seja. Eu não quero fazer uma quimioterapia e vou
morrer, o problema é meu”, disse o presidente. “Aqui não é Venezuela, aqui não
é Cuba. E não temos ditadura aqui, como a imprensa cansa de alardear. Não
persegui gays, não persegui mulheres, não persegui nordestinos, não persegui
negros, liberdade total.”
Ao concordar com a vacinação
compulsória contra a covid-19 no julgamento de ontem, o ministro Alexandre de
Moraes destacou os efeitos da pandemia no Brasil, onde mais de 7 milhões de
brasileiros já foram infectados. “A preservação da vida, da saúde, seja
individual, seja pública, em país como Brasil com quase 200 mil mortos pela
covid-19, não permite ao tratarmos desse tema, e por isso a importância dessa
Corte defini-lo, não permite demagogia, hipocrisia, ideologias, obscurantismo,
disputas político eleitoreiras e principalmente não permite ignorância”,
afirmou Moraes.
Para a ministra Cármen Lúcia,
“a Constituição não garante liberdade a uma pessoa para ela ser soberanamente
egoísta. É dever do Estado, mediante políticas públicas, reduzir riscos de
doenças e outros agravos, adotando as medidas necessárias para proteger a todos
da contaminação de um vírus perigoso”, disse. Marco Aurélio Mello concordou.
“Vacinar-se é um ato solidário”, disse.
Indicado ao STF pelo presidente Jair Bolsonaro, o ministro Nunes Marques concordou com os colegas no sentido de que Estados e municípios podem instituir a obrigatoriedade da vacina, mas colocou requisitos. Acabou isolado.
Ao longo dos últimos meses, o
Supremo tem imposto uma série de derrotas ao governo federal em questões
referentes à pandemia. O STF já contrariou Bolsonaro ao garantir a Estados e
municípios o direito de decretar medidas de isolamento social para combater à
disseminação da covid-19. O tribunal também obrigou o Ministério da Saúde a
divulgar, integralmente, os números de mortos e infectados pela doença.
Ontem quinta-feira, em uma
decisão individual, o ministro Ricardo Lewandowski autorizou governadores e
prefeitos de todo o País a adquirir vacinas registradas por autoridades
sanitárias estrangeiras, caso a Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa) não dê aval ao imunizante dentro de um prazo de 72 horas. Mas a medida
só poderá ser tomada em caso de descumprimento do plano nacional de vacinação
por parte do governo federal e não vale para os pedidos emergenciais – o
imunizante da Pfizer, por exemplo, obteve apenas este aval nos EUA e no Reino
Unido. (Colaboraram Mateus Vargas e Emilly Behnke)
As informações são do jornal O
Estado de S. Paulo.
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